Por Elio Gaspari, jornalista
Artigo publicado nos jornais Folha de S. Paulo e O Globo de hoje
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Precisa-se do olho do juiz
americano Potter Stewart,
aquele que não sabia definir pornografia
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As guildas e o corporativismo de juízes estão produzindo fatos e números que apequenam o Poder Judiciário. A corregedora nacional de Justiça, Eliana Calmon, criticou a "impunidade da magistratura", reclamou da sua blindagem e fez a frase de sua vida: "Sabe que dia eu vou inspecionar São Paulo? No dia em que o sargento Garcia prender o Zorro." (O gorducho Garcia está atrás dele desde 1919.)
Em seguida, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Cezar Peluso (ex-desembargador do TJ de São Paulo), deu-lhe resposta: "Em 40 anos de magistratura nunca li coisa tão grave. (...) É um atentado ao Estado democrático de Direito".
Menos de um mês depois, o presidente do tribunal paulista pediu à Secretaria de Segurança a criação da figura de um "delegado especial" para cuidar de incidentes que envolvam juízes ou desembargadores. Só para eles. Os cardeais, as costureiras e os contadores continuariam democraticamente com a patuleia.
Vai-se adiante e vê-se que em 152 inquéritos que tramitam no STF envolvendo deputados, senadores e ministros, os nomes dos hierarcas são protegidos, apesar de não correrem em segredo de Justiça. Por exemplo: há um inquérito que trata das atividades de J.M.R. (A deputada filmada recebendo dinheiro do mensalão do DEM chama-se Jaqueline Maria Roriz, mas isso não é da sua conta).
A blindagem do andar de cima tem registro estatístico: há no Brasil 512 mil presos, 76 por corrupção passiva.
As guildas de magistrados organizam eventos arrecadando patrocínios com empresários e instituições que têm interesse em processos que podem passar por suas mesas. Isso para não falar do turismo embutido em muitos congressos, conferências e reuniões de fancaria.
A doutora Eliana Calmon pretende estabelecer critérios para essas atividades e as associações nacionais de juízes federais e do Trabalho informam que recorrerão em defesa daquilo que é um direito "inerente a todos os brasileiros e ao regime democrático". Grande ideia, pois os tribunais são o foro adequado para resolver questões desse tipo. (Graças à grita de alguns magistrados, Eliana Calmon detonou uma caixa de fraudes nos empréstimos que a Associação de Juízes Federais da 1ª Região fazia em uma financeira).
A magistratura é uma carreira vitalícia iniciada, por concurso, num patamar de R$ 18 mil mensais, com dois meses de férias, aposentadoria integral e plano de saúde. Ninguém pode demitir um juiz.
Já o juiz pode ir embora no dia que quiser, passando para a Advocacia privada, muitas vezes com êxito. Essa característica diferencia os magistrados dos vereadores e deputados, obrigados a renovar o contrato de trabalho junto à clientela a cada quatro anos. Eles optaram por uma carreira especial e são os responsáveis exclusivos pelo prestígio do Poder republicano que exercem.
A insensatez e o corporativismo jogaram a imagem do Judiciário no balcão da defesa de causas perdidas. Não se pode criar um critério para decidir o que engrandece ou apequena a magistratura. Pode-se, contudo, seguir a recomendação subjetiva do juiz Potter Stewart, da Corte Suprema americana, tratando de outra agenda: "Eu não sei definir pornografia, mas reconheço-a quando a vejo".
sexta-feira, 11 de novembro de 2011
A marcha de juízes insensatos
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